Coletânea traz registro histórico da luta das rádios comunitárias pela democratização da comunicação que, nas décadas de 1990 e 2000, estava centralizada na "reforma agrária do ar"
Por Kassia Nobre
O Grupo de Pesquisa Rádio e Mídia Sonora acaba de lançar o livro “Rádios Comunitárias no Brasil: resistências, lutas e desafios” (Appris).
A obra reúne oito artigos que retratam a história das rádios comunitárias no país e é voltado para estudantes, professores e pesquisadores de comunicação e áreas afins.
O Portal Imprensa conversou com o organizador do livro, o professor da Universidade do Ceará (UFC), Ismar Capistrano Costa Filho, sobre a curadoria dos artigos e dos temas apresentados.
O professor explica que a coletânea representa um registro histórico da luta das rádios comunitárias pela democratização da comunicação que, nas décadas de 1990 e 2000, estava centralizada na "reforma agrária do ar" e atualmente se expande para as redes digitais, inclusive com as resistências destas estações nesta ambiente.
“Em 2018, como estávamos registrando 20 anos da Lei de Radiodifusão Comunitária (9.612), sugeri organizarmos um livro com uma coletânea de artigos sobre rádios comunitárias, pois sempre o grupo recebia este tipo de relato de pesquisas sobre o assunto”, explica.
Portal Imprensa - A ideia do livro surgiu nas discussões e planejamento do Grupo de Pesquisa Rádio e Mídia Sonora no Congresso do Intercom de 2018. Você poderia contar um pouco sobre este momento?
Ismar Capistrano - O grupo de Pesquisa Rádio e Mídia Sonora realiza sempre ao final do Congresso uma reunião que avalia o evento, as produções do ano e fazem planejamento de publicações, pesquisas e atuações em conjunto. Em 2018, como estávamos registrando 20 anos da Lei de Radiodifusão Comunitária (9.612), sugeri organizarmos um livro com uma coletânea de artigos sobre rádios comunitárias, pois sempre o grupo recebia este tipo de relato de pesquisas sobre o assunto. A proposta foi aprovada e começamos os trabalhos.
Portal Imprensa - O livro reúne 8 artigos que retratam a história das rádios comunitárias. Como foi a curadoria dos artigos e dos temas?
Ismar Capistrano - Abrimos um convocatório para os autores de artigos do GP Rádio e Mídia Sonora e outras instituições submeterem artigos. A convocatória foi divulgada pelo site da Intercom e também em listas de e-mails como da sociocom e Compós. Recebemos 14 artigos que foram avaliados por um comitê de doutores (as) formado por mim, pela profa. Catarina Tereza Farias de Oliveira e pela pesquisadora Márcia Vidal Nunes e, em caso de divergência nos pareceres, convidamos o prof. Edgard Patrício de Almeida Filho. Foram selecionados 10 artigos e 8 aceitaram as condições da publicação. Nesta seleção, foram levados em conta os critérios de profundidade, adequação metodológica, aderência com o projeto, referencial e atualidade.
Portal Imprensa - O livro aborda o papel do rádio na luta pela democratização da comunicação nas décadas de 1990 e 2000 e no ambiente digital nos dias de hoje. Como o livro aprofunda essas questões?
Ismar Capistrano - O livro possui os artigos "Sobre Comunas comunicacionais radiofônica" de João Paulo Malerba e "Rádios Comunitárias: a retomada do ideal comunitário no processo do fortalecimento da organização popular" de Márcia Vidal Nunes que tratam sobre a história de lutas das emissoras comunitárias desde a clandestinidade à legalização e organização em movimento social. Já a trajetória das rádios comunitária na década de 1990, abordando principalmente sobre a criação das emissoras num ambiente de perseguição e a busca por participação social e legalização, é apresentada nos artigos "Do alto-falante à rádio comunitária Bacanga FM" de Ed Wilson Ferreira Araújo e outros e "Os Receptores das Rádios Comunitárias em Fortaleza" de Catarina de Oliveira. Sobre a realidade atual das rádios comunitárias, os artigos "Cidadania Comunicativa e Autonomia Comunicativa" de minha autoria e "Rádios Comunitárias só no nome" de Giovana Borges, Sheila Borges, Diego Gouveia e Rodrigo Barbosa, mostram, no primeiro, as rádios comunitárias que resistem como expressão da luta pela democratização da comunicação e, no segundo, as falsas rádios comunitárias que possuem autorização nesta modalidade, mas não atuam neste sentido.
Portal Imprensa - Como você enxerga a importância do rádio hoje e o surgimento dos podcasts?
Ismar Capistrano - O rádio, assim como os meios de comunicação tradicionais, passam por uma midiamorfose, tendo de estender para outras linguagens e formatos seu conteúdo e densificar a interatividade. Esse processo ocorre, principalmente, em ambientes privados, como as redes sociais digitais que possuem interesse de conquista de audiência, reação e permanência nas publicações, por isso priorizam postagens patrocinadas ou de perfis que possuam grande audiência, transferida pela grande mídia ou criada, principalmente, pelas polêmicas nos caça-cliques. Essa conjuntura traz sérias dificuldades para a expansão das rádios comunitárias nas plataformas digitais, o que é agravado pelas dificuldades técnicas e de capacitação destas emissoras. Por isso, para que as rádios comunitárias possam atuar nas redes sociais e na produção e circulação de podcasts é necessário uma regulação democrática das plataformas digitais que reconheçam essas como ambientes de interesse público. Também é preciso investir na inclusão digital destas emissoras, não só investimentos técnicos, mas com capacitação para suas equipes.
Portal Imprensa - Quem é o público-alvo do livro?
Ismar Capistrano - Estudantes, professores e pesquisadores de comunicação e áreas afins e pessoas interessadas na temática.
Fonte: Portal Imprensa